A investigação que tem vindo a ser produzida sugere que, em algumas poucas semanas, a prática da meditação mindfulness é capaz de trazer benefícios a nível fisiológico, psicológico e social. Desde aumentar a massa cinzenta do cérebro ao aliviar de maleitas físicas, como no caso das enxaquecas ou da fibromialgia, os benefícios atribuídos ao mindfulness e, de uma forma mais geral, à prática da meditação, têm sido advogados por um vasto leque de pessoas, desde o executivo ao professor primário.
Embora alguns se tenham mostrado críticos em relação à ciência que lhe está por trás, devido ao tamanho limitado dos estudos e dos seus efeitos, isso não tem feito diminuir um interesse mais ou menos generalizado. Um estudo recentemente publicado procurou examinar a cobertura da media escrita sobre meditação entre 1979-2014, tendo descoberto uma quase omnipresente cobertura de carácter positivo.
Perante um tão grande número de opiniões favoráveis à meditação mindfulness, pode ficar difícil decifrar quais as que são suportadas por investigação científica qualificada e as que ainda se encontram numa fase preliminar ou até mesmo especulativa. Eis algumas questões que ainda estão a ser exploradas, juntamente com algumas dicas para um consumo mais criterioso de notícias e investigação sobre o tema.
Quais são os verdadeiros benefícios da meditação mindfulness?
Ainda recentemente, vi parangonas a promover o quanto o mindfulness e a prática da meditação podem “diminuir o risco de cancro”, “reduzir os excessos nas férias” ou a ajudar atletas a atingir o topo. Serão estas atribuições verdadeiras?
Em vez de confiarmos em um único estudo, o mais seguro é, sempre que possível, olharmos para as “meta-análises” (análise estatística de uma série de estudos sobre uma determinada questão). Por exemplo, uma recente meta-análise publicada na JAMA Internal Medicine causou uma certa agitação na comunidade ligada à meditação. O artigo científico analisou 47 experiências, escolhidas ao acaso, com programas de meditação mindfulness, envolvendo um total de 3.515 pessoas. Os responsáveis pelo paper concluíram que esses programas resultaram apenas numa diminuição pequena ou moderada em questões de ansiedade, depressão e dor. Os autores notaram ainda que, embora os seus efeitos sejam diminutos, são, ainda assim, “comparáveis aos efeitos expectáveis no uso de antidepressivos, mas sem a toxicidade a eles associada.”
Surpreendentemente, a análise apresentou poucas evidências de melhoria em relação ao stress, angústia e qualidade de vida. Mais, este trabalho apresentou baixo, insuficiente ou mesmo não evidências quanto ao efeito desses programas nos estados de humor, emoções positivas, atenção, consumo de substâncias tóxicas, hábitos de alimentação, qualidade do sono e controlo do peso. Segundo os seus autores, os programas de meditação não se mostraram mais benéficos do que outros métodos de tratamento ativo, como o exercício físico, a psicoterapia ou a terapia medicamentosa. A meditação, no entanto, nunca se mostrou nociva.
Embora seja possível que os benefícios da prática da meditação sejam mais modestos do que aqueles originalmente assumidos, é preciso ter em conta uma série de entraves ao estudo das práticas contemplativas e da influência que essas mesmas dificuldades refletem sobre a qualidade da investigação que tem sido conduzida. Entre as mais relevantes, a falta de fundos (com influência no número de participantes, duração e desenho dos estudos) e a pouca qualidade dos meios de medição das pesquisas (as quais têm sido limitadas basicamente a questionários de qualidade variável, o que está igualmente ligado à questão da falta de fundos).
Seja como for, o consenso resultante desta meta-análise é que, embora existam alguns benefícios, os programas de meditação mindfulness não constituem uma cura para todos os males da vida moderna.
Quanto prática é suficiente?
Enquanto alguém que ensina meditação (baseada em mindfulness e na compaixão), a questão que me colocam repetidamente é: “quanta prática é suficiente?” A maioria das pessoas procura uma resposta do tipo “45-60 minutos, três vezes por semana”; a isso respondo, por vezes, com um velho ditado zen: “Devemos sentar-nos em meditação durante 20 minutos por dia, a menos que estejamos demasiado ocupados… nesse caso, devemos sentar-nos durante uma hora.” Mas, normalmente, a minha resposta é aquela tão pouco satisfatória de “depende”. Até ao momento, a investigação empírica ainda está por chegar a um consenso sobre a quantificação do “suficiente”.
Diversos programas sugerem que os seus participantes pratiquem meditação formal (sentar no zafu) entre 15-30 minutos por dia, 5-7 dias por semana. Vários estudos de investigação, entre eles alguns da nossa autoria na Universidade de Stanford, sobre Redução de Stress Baseado em Mindfulness (MBSR) e Treino da Compaixão (Compassion Cultivation Training-CCT), concluíram que alguns (não todos) dos benefícios trazidos por estes programas “dependem da dosagem”. Isto é, os participantes que se apresentam com mais prática meditativa são os que mostram mais benefícios. No entanto, isto não é uma verdade absoluta; existem alguns resultados que não parecem ter sido influenciados pelo tempo de prática, assim como vários estudos publicados que não mostram qualquer “efeito de dose”. Como muitas vezes acontece na investigação, os resultados são mistos.
À parte a questão árida do número de minutos, outros fatores podem ter influência: o tipo de prática (formal/informal, atenção plena/compaixão…), a frequência (número de vezes ao dia/semana) e a qualidade da prática.
Embora seja possível que nos próximos 10-15 anos possa aparecer algum tipo de recomendação oficial sobre a prática da meditação, os dados de que dispomos, hoje, ainda são inconclusivos. Assim, o meu conselho (neste momento) é experimentar diferentes tipos de meditação, com frequência e duração variável, anotando as sensações antes e após a prática. Ter um tempo para refletir de forma intencional nas experiências pessoais durante a prática é o fundamental. Para alguns, meditar durante 20-30 minutos por dia pode ser suficiente, enquanto outros poderão querer dedicar mais ou menos tempo; a única forma de descobrir o que é apropriado para cada um é experimentando.
Existe um “lado negro” na meditação?
Um dos grandes equívocos sobre a prática da meditação é a de que esta induz um sentimento de paz e tranquilidade, reduzindo o stress. Embora podendo ser verdade em muitos casos, não é necessariamente assim para toda a gente. Por vezes, sentar em silêncio consigo próprio pode constituir uma experiência difícil e até mesmo dolorosa. Para pessoas que experimentaram algum tipo de trauma, sentar para meditar pode, por vezes, despertar memórias e experiências dolorosas (recentes ou com décadas), que a pessoa pode não estar preparada para enfrentar.
Pouco sabemos ainda sobre estes efeitos adversos. Há alguns anos, Willoughby Britton, da Universidade Brown, lançou o projeto “The Varieties of Contemplative Experience”, em uma tentativa para analisar e documentar (e publicar) casos de efeitos adversos decorrentes da meditação e de outras práticas meditativas. Enquanto continua a decorrer a recolha de informação, é provável que tenhamos em breve dados preliminares sobre efeitos adversos em certo tipo de indivíduos.
Em alguns casos, em paralelo com a meditação, poderá ser apropriado procurar algum tipo de ajuda externa, como psicoterapia de apoio, grupos de auto-ajuda ou sanghas de meditação. Poderá também acontecer que algumas práticas sejam mais “difíceis” do que outras (práticas onde nos observamos enquanto criança podem ser particularmente difíceis em casos de pessoas que tenham sido alvo de abuso infantil). Em vez de nos forçarmos às diversas prática, há que avaliar se um determinado tipo de meditação é a que nos é mais conveniente num preciso momento.
Sobre a autora: Hooria Jazaieri é professora, psicoterapeuta e investigadora na Universidade Berkeley.