Enfrentar o medo: para ultrapassar a depressão primeiro tive que a abraçar

No início, não achei que a mera aceitação dos meus sintomas fosse uma grande ajuda. Mas, aos poucos, começou a ser evidente que a meditação resultava comigo
Por Ed Halliwell | Pep Boatella (ilustração)
in The Guardian | 23 de setembro de 2016  ver artigo original
Há dois anos e meio que vinha lutando (ou fugia) com a minha depressão, sem que qualquer tipo de abordagem experimentado até então tivesse resultado. Perseguida de forma implacável por pensamentos de autopunição, forte tensão muscular no pescoço e nos ombros, palpitações e mal-estar intestinal, tentei tudo para me libertar daquilo que constituía então um inferno diário contínuo.
Um novo emprego? Confere. Terapia? Fiz. Mudar de casa? Também. Medicação? Receita após receita. Mas não havia nada que fizesse mudar aquela terrível combinação de tristeza e pânico que havia tomado conta de mim uma semanas antes do meu 28º aniversário.
Mas porquê comigo? Era isso que eu não conseguia entender! O que é que eu estava a fazer de tão errado que me mantinha neste estado, quando a minha vida – uma boa educação, boas perspectivas profissionais, uma família e amigos presentes – parecia, aparentemente, tão privilegiada?
O que estava a acontecer é que era a própria resistência aos pensamentos e sensações desagradáveis que os continuava a alimentar. Pese embora uma série de acontecimentos stressantes – uma relação amorosa que se desfez, a compra de casa própria, o haver-me apercebido que estava na carreira profissional errada – tenha despoletado esse episódio, há muito que o meu padrão de comportamento era o de lutar ou fugir das emoções difíceis. A minha reação à ansiedade, como se esta se tratasse de um predador em vias de me devorar, era particularmente reveladora: quanto mais tentava lutar ou fugir, mais agitada e exausta ficava.
A dada altura percebi que não podia continuar a fugir de mim própria (afinal, para onde quer que vamos, acabamos inevitavelmente por esbarrar em nós). E é com uma sensação de grande alívio que digo que, embora tivesse tentado, nunca me pareceu que eu fosse capaz de me maltratar, isto é, levar a luta comigo própria ao extremo. Mas o que fazer em alternativa? Sobre isso, não tinha a menor ideia.
É claro que através das minhas inúmeras leituras sobre auto-ajuda acabei por tropeçar na meditação. Cheguei mesmo a tentar, aqui e ali, durante alguns minutos, para de seguida abandonar, frustrada, quando a experiência não se revelava em nada parecida com a paz do Buda que eu tinha esperança em encontrar. Ainda assim, havia alguma coisa no mindfulness que fazia sentido para mim: se eu conseguisse encontrar uma relação amistosa com o presente, poderia isso ajudar-me, pelo menos nas situações em que a vida não se curvava perante os meus planos?
Por fim, em vez de ler sobre a vida meditativa, passei a procurar instruções práticas, o que veio a revelar-se fundamental. O meu orientador soube como me iniciar devagar (tomar um chá com atenção plena, alguns períodos curtos diários de sentar em silêncio), tranquilizando-me em relação ao meu turbilhão de pensamentos e emoções não terem nada de invulgar. A chave da questão estava na forma em como me relacionava que eles: em vez de os tentar evitar ou livrar-me deles, comecei a estar confortável em sentir-me desconfortável, largar o desejo desesperado para que algo de melhor acontecesse. Uma sensação profundamente contra-intuitiva, mas de alguma forma libertadora.
De forma gradual, fui começando a trabalhar em sessões maiores: 10 a 15 minutos por dia. Por essa altura, ainda não me sentia melhor – o meu padrão psíquico de luta ou fuga estava bem enraizado -, mas havia uma mudança que começava a acontecer, pelo que quando voltei a cair num frenesim de ansiedade, meti baixa por doença, fiquei em casa e reconheci e aceitei esse meu estado. Senti todas as emoções, deixei que os pensamentos aparecessem livremente e fiz o possível para permanecer pacientemente presente, apesar da vontade que tinha de gritar. Dez dias mais tarde, numa manhã de sexta-feira, em pleno banho de imersão, os sintomas da depressão passaram. Pela primeira vez em quase três anos, senti-me feliz.
Não se tratou de um processo rápido de cura. Ao longo dos anos já tive várias recaídas, mas com o tempo estas têm vindo a diminuir em número e em intensidade, e a minha vida tem-se vindo a orientar na direção da paz. Acredito sinceramente na importância do empenho persistente e continuado com a prática da meditação, a qual me ensinou a receber o prazer e a dor com uma maior atitude de equanimidade. A meditação tem-me ajudado a perceber, não só os hábitos que conduzem ao sofrimento, mas também os meios que nos são oferecidos para desatar essa teia.
Tornei-me mais capaz de suportar e lidar com os sintomas de tristeza e pânico que vêm, às vezes, fazer-me companhia. Em resposta aos chamamentos do corpo e da mente, tenho sido capaz de empreender uma série de mudanças importantes, as quais antes me pareciam totalmente inalcançáveis.
Há 15 anos não acharia possível que a via para superar o meu tormento psíquico passasse por me voltar, gentilmente, sobre ele, com serenidade e um sorriso. E, no entanto, a recompensa de fazer uma e outra vez esse caminho, por difícil que ele seja, ultrapassou largamente as minhas melhores expectativas.
Tradução para português por Mindmatters

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