Estudo liga racismo a doenças do coração

Por Yasmin Anwar
in Berkeley News | 6 de setembro de 2016  ver artigo original
Viver em comunidades declaradamente racistas pode conduzir a uma diminuição do tempo de vida – de pessoas brancas e de negras -, segundo um estudo recente da Universidade da Califórnia, Barkeley.
Os investigadores compararam o preconceito racial de 1,4 milhões de pessoas com as taxas de mortalidade verificadas em 1700 municípios norte-americanos. Segundo sugerem os dados obtidos, os negros, e em menor grau os brancos, que residem em comunidades abertamente racistas são mais propensos a morrer de problemas cardíacos e de outras doenças circulatórias.
“Isto sugere que viver num ambiente racialmente hostil pode ser determinante tanto para o grupo alvo do preconceito (neste caso, os negros) como para os que o alimentam (neste caso, brancos)”, diz o estudo coordenado por Jordan Leitner, pós-doutorando em psicologia na UC Barkeley. Os resultados do estudo acabam de ser publicados na edição online da revista científica Psychological Science.
A equipa de investigadores, que contou ainda com Ozlen Ayduk e Rodolfo Mendoza-Denton da UC Berkeley, e Eric Hehman da Universidade Ryerson, Toronto, detectaram ainda diferenças consideráveis ao nível do acesso a serviços de saúde. O estudo constatou que as pessoas negras que vivem em comunidades mais radicais a nível racial reportaram um menor acesso a cuidados de saúde, ao contrário dos brancos que disseram ter um acesso relativamente alto, independentemente do preconceito racial existente nas suas comunidades.
O estudo teve em conta idade, instrução, rendimento, grupo populacional, distribuição populacional por áreas (urbano/rural), além de outros fatores capazes de terem influência ao nível da saúde.
Enquanto que em estudos anteriores o nível de discriminação aparecia ligado a resultados negativos de saúde, este é o primeiro a recolher uma grande quantidade de dados anteriormente não disponíveis e a avaliar a relação entre preconceito racial branco e saúde – de brancos e negros – nas comunidades, disse Leitner.
Neste estudo, a equipa de investigação comparou taxas de mortalidade referentes a doenças circulatórias de 2003 a 2013 – recolhidas pelos Centros de Controlo de Doenças – com os dados sobre preconceito racial fornecidos pelo Project Implicit, um website que disponibiliza testes para medir as predisposições implícita e explícita em relação a género, religião e raça/etnia.
A predisposição explícita refere-se ao preconceito mais consciente enquanto que a implícita reflete uma reação automática mais vaga. Esta forma de avaliação é largamente usada na investigação em ciências sociais.
Para avaliar a predisposição racial implícita, foi pedido aos participantes no estudo para para classificarem uma série de rostos no computador; de seguida, foi-lhes dado ver uma série de palavras de cariz positivo e negativo, como: “desagradável”, “angústia”, “felicidade” ou “paz”, às quais teriam de categorizar como “bom” ou “mau”.
Foram usadas formas semelhantes para identificar um rosto de raça branca ou negra e para atribuir um valor positivo ou negativo. Os participantes que responderam de forma mais rápida obtiveram um valor mais alto em predisposição implícita por associarem de forma mais automática uma pessoa negra a atributos negativos.
Para medir posições manifestamente racistas, os participantes classificaram numa escala de 0 a 10 os seus sentimentos positivos sobre brancos e negros. Foi definido como racismo evidente aquele que mostra mais apreço por brancos em relação a negros.
Embora os dados digam respeito a sentimentos pessoais sobre raça, o enorme volume de respostas (perto de 1,4 milhões) oferece um olhar bastante profundo sobre o posicionamento racial de uma comunidade, salientou Leitner.
A análise dos dados mostrou que os municípios com taxas mais elevadas de acidentes cardíacos fatais eram, de forma consistente, aqueles onde as pessoas reportaram níveis mais altos de preconceito racial e onde os negros impactavam mais negativamente nesta tendência.
“Descobrimos que o preconceito explícito branco era mais forte do que o seu preconceito implícito na previsão de resultados de saúde negativos em relação aos negros”, disse Leitner.
Quanto à relação entre o preconceito explícito branco e as taxas de mortalidade, Leitner referiu um estudo recente da Universidade da Pensilvânia, o qual sugere que os brancos pertencentes a comunidades mais fortemente preconceituosas têm mais dificuldade em criar laços de confiança e de socialização nas suas comunidades, podendo esta falta de ligação social ter implicações negativas ao nível da saúde.
As doenças circulatórias, as quais incluem enfarte do miocárdio, angina de peito e doenças coronárias, são a principal causa de morte nos Estados Unidos (n.d.t. e em Portugal). Embora o estudo não faça uma relação causa-efeito entre racismo e mortalidade devido a acidentes circulatórios, os investigadores especulam sobre os efeitos da combinação stress ambiental, causado pelo clima de hostilidade racial, e discriminação nos cuidados de saúde possam criar ou até mesmo agravar doenças circulatórios na população negra.
“Uma das possibilidades é que as pessoas negras que vivem em comunidades racialmente hostis estejam sujeitas a cuidados de saúde de pior qualidade; ou que evitem procurar assistência médica, mesmo quando disponível, devido a um sentimento de que não serão tratadas de forma adequada”, explicou Leitner.
No geral, refere Leitner, o estudo realça o poder do racismo explícito e do seu efeito prolongado, uma discussão que, nos anos mais recentes, tem sido colocada em segundo plano devido à crescente consciência sobre preconceitos inconscientes.
Embora o racismo explícito tenha vindo a diminuir em termos nacionais nos Estados Unidos, Leitner afirma que ele “ainda é um forte indicador de como brancos e negros têm acesso à saúde numa determinada comunidade”.
No seguimento deste estudo, Jordan Leitner pretende olhar para as tendências a longo prazo para verificar se o preconceito racial está efetivamente a causar disparidades ao nível da saúde. Leitner pretende ainda investigar de que forma posições raciais por parte de negros pode afectar os resultados em matéria de saúde.
Tradução de Raul C. Gonçalves

 

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