Como respondem os cérebros mais felizes a acontecimentos negativos

Uma nova pesquisa fornece todo um novo conhecimento sobre a amígdala no cérebro e indica que as pessoas felizes aceitam o mal e o bem como um todo.
Por Summer Allen | Jeremy Adam Smith
in Greator Good | 17 de março de 2016
Deixou cair um prato no chão enquanto fazia o pequeno almoço; ficou engarrafado no trânsito enquanto ia para o trabalho; o seu chefe gritou consigo porque chegou tarde… Parabéns! você está a ter uma uma manhã daquelas… Uma vez por outra, acontece a todos. No entanto, a forma como reagimos a pequenas contrariedades do dia a dia revela imenso sobre o nosso cérebro.
Pode parecer óbvio, mas pessoas mais positivas são mais capazes de gerirem as suas emoções em comparação com aquelas com personalidades mais pessimistas, as quais têm mais probabilidades de serem atingidas por acontecimentos desagradáveis. E porque é que isto acontece?
São várias as possibilidades. Uma é que as pessoas mais felizes vêm a vida, metaforicamente, através de lentes cor de rosa, o que lhes permite concentrarem-se nos aspectos positivos enquanto “filtram” os lados negativos. Outra possibilidade poderá ser o das pessoas felizes serem capazes de saborear melhor os factos positivos, permitindo melhorar o seu estado de humor, mas não deixando, no entanto, de observar os acontecimentos negativos.
E porque é importante esta questão? Devido às implicações em como cada um vê a sua vida. No geral, será melhor ignorar os acontecimentos negativos e contrariedades ou, pelo contrário, reforçar a nossa capacidade em valorizar os aspectos positivos sem esconder os negativos?
Uma forma de testar esta hipótese é através da observação do funcionamento da amígdala – uma pequena região do cérebro em forma de almôndega – em pessoas com estados emocionais diferentes. Durante anos, os neurocientistas olharam para este grupo de neurónios como um primitivo “centro operacional do medo” do cérebro, em estado de alerta permanentemente a potenciais ameaças. O aumento da atividade da amígdala em algumas pessoas tem sido ligado a casos de depressão e ansiedade. No entanto, sabe-se menos sobre como responde a amígdala a estímulos positivos e como esta atividade poderá estar relacionada com o sentimento de emoções positivas.
É precisamente isto que os psicólogos William Cunningham (Universidade de Toronto) e Alexander Todorov (Universidade de Princeton) e colegas estão a explorar. Numa série de estudos recentes patrocinados pela Fundação John Templeton estes cientistas descobriram uma amígdala totalmente nova, a qual está ligada às relações humanas, à compaixão e à felicidade. De acordo com as suas pesquisas até à data, as pessoas mais felizes não ignoram as ameaças, elas são é mais capazes de verem os aspectos positivos.
Para que serve a amígdala?
Uma zebra selvagem necessita estar permanentemente em alerta em relação a leões e outros predadores, mesmo durante a persecução de um objetivo, tal como procurar água ou acasalar. Tradicionalmente, os cientistas têm ligado esta função de alerta à amígdala. No entanto, estudos recentes apontam para o facto da amígdala estar também ativa quando as pessoas procuram satisfazer os chamados “objetivos apetitosos”, tais como o interesse da nossa zebra em beber, comer e acasalar.
Uma vez que situações ameaçadoras podem ter consequências letais, faz todo o sentido que a amígdala esteja preparada para reagir a todos os estímulos de medo. Mas será que a amígdala responde igualmente a todos os estímulos positivos? Será que a amígdala da nossa zebra se ativa sempre que descobre uma poça de água, sempre que vê uma coisa boa?
William Cunningham e respectiva equipa debruçaram-se sobre este assunto num estudo publicado no ano passado no Journal of Cognitive Neuroscience. O trabalho, que contou com 15 participantes, compara uma série de imagens obtidas por ressonância magnética (fMRI) sobre a atividade das respectivas amígdalas. As imagens apresentam variações em relação ao seu conteúdo emocional (positivo, negativo ou neutro), bem quanto às emoções sugeridas.
A partir dos dados recolhidos por ressonância magnética a equipa liderada por William Cunningham comprovou que, tal como esperado, imagens negativas provocaram atividade da amígdala. O mesmo aconteceu com imagens positivas, mas apenas quando foi pedido explicitamente aos participantes para se focarem nelas.
Os humanos têm uma predisposição negativa, uma tendência para se concentrarem no que constitui ameaça. No entanto, este estudo indica que as pessoas são capazes de compensar esta tendência se, de uma forma consciente, se focarem mais no que é positivo. Segundo escreveram os autores, “embora as pessoas respondam automaticamente aos estímulos negativos, elas podem apresentar a mesma sensibilidade aos estímulos positivos, desde que lhes sejam proporcionadas a necessária capacidade e motivação para tal.”
Um outro estudo de uma equipa de cientistas em que faziam parte William Cunningham e Alexander Todorov – a ser publicado este ano em livro com o título Positive Neuroscience – descobriu que a amígdala pode estar no âmago da compaixão”.
Os cientistas fizeram ressonâncias magnéticas aos cérebros dos participantes enquanto estes olhavam imagens de pessoas em situações que podiam ser úteis à execução de um determinado objectivo ou, inversamente, em situações de precisarem de ajuda. A equipa descobriu que a atividade da amígdala apresentava picos assim que os participantes reconheciam pessoas em situação de necessidade de proteção. Não é de todo surpreendente que tal tenha sido particularmente verdade em relação aos participantes com valores mais elevados a nível de empatia.
Tal como é referenciado pelos autores, uma outra pesquisa encontrou ligações à capacidade de ajuda e interconexão com outros ao sentimento de bem-estar pessoal. Vistos em conjunto, estes estudos sugerem que os humanos possuem no seu subconsciente um “instinto de compaixão”, uma necessidade de ajudar pessoas que se manifesta mesmo em partes do cérebro referidos, às vezes, como “primitivos” ou “reptilianos”. O artigo conclui que “esta projecto de investigação assenta na ideia de que o nosso sistema evolutivo cerebral mais remoto não é, exclusivamente, uma fonte de imoralidade e egoísmo, mas quando sintonizado nos nossos objetivos pode contribuir para um comportamento moralmente justo. Como tal, o florescimento do ser humano não advém da supressão de determinados aspectos do “eu”, mas sim através da integração de todos os processos relevantes integrados numa resposta unificada.
Pessoas felizes aceitam igualmente o bom e o mau
Esta pesquisa, no entanto, levanta uma outra questão: depende a felicidade do ser humano do filtrar dos aspectos negativos da vida? Ou em linguagem científica: queremos evitar o stress da ativação da amígdala, mesmo quando se trata de detectar pessoas em risco? Como é que reagem as pessoas felizes ao derrubar de um prato, ao engarrafamento no trânsito, ameaças do patrão ou até mesmo ao avistar de um sem-abrigo?
Esta é a questão abordada num outro estudo publicado no boletim Social Cognitive and Effective Neuroscience, onde William Cunningham e Tabitha Kirkland, estudante de doutoramento, procuraram determinar se a amígdala de pessoas felizes responde de forma diferente em relação a estímulos negativos e positivos quando comparado com pessoas menos felizes.
Cunningham e Kirkland gravaram a atividade da amígdala em 42 participantes à medida que estes visionavam uma série de imagens de conteúdo positivo, negativo e neutro. A partir de um questionário, foi-lhes ainda determinado os seus níveis de felicidade subjectiva. Apresentou-se alguma diferença em como os cérebros das pessoas mais felizes responderam aos diferentes tipos de imagem?
De facto, assim foi. Quando comparado com pessoas com menores níveis de felicidade, os pesquisadores descobriram que as pessoas mais felizes tinham uma maior ativação em resposta às imagens positivas. E, no entanto, não apresentavam qualquer diminuição de resposta perante as imagens negativas, como seria expectável segundo o ponto de vista da felicidade a partir das “lentes cor de rosa”.
Na verdade, os cientistas descobriram que “a ativação da amígdala entre os participantes mais felizes era tão elevada em relação aos estímulos positivos quanto aos negativos. De acordo com o trabalho, isto indica que as “pessoas mais felizes não são necessariamente ingénuas ou cegas relativamente ao que é negativo, antes conseguem adaptar as suas respostas às situações, reconhecendo na vida quer as coisas boas como as más.”
Esta descoberta é particularmente interessante porque sugere que o facto de se ser capaz de detectar e responder a informações negativas pode ser na verdade uma parte importante da felicidade. E concluem os autores do estudo: “As pessoas felizes são alegres, porém equilibradas”.
O conclusão final deste estudo é que a amígdala não pode mais continuar a ser vista como um centro do medo do cérebro. Pelo contrário, parece que mesmo a um nível muito instintivo, todos possuímos ligações no sentido de ver e ajudar as pessoas em necessidade e que, ao fazê-lo, ajuda-nos a ser mais felizes.
Tradução Raul C. Gonçalves
http://greatergood.berkeley.edu/article/item/how_happy_brains_respond_to_negative_things

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