Por Emma Tracey in BBC News, Ouch | 6 de Janeiro de 2015
Vidyamala Burch ajuda pessoas em estado de dor através da prática de “mindfulness”, o ato de prestar mais atenção ao momento presente. Mas antes foram precisos vários anos até descobrir isso para si própria.
Quando as pessoas estão a passar por problemas sérios, isso pode revelar os lados extremos da sua personalidade, afirma Vidyamala Burch, de 55 anos, médica na área do controlo da dor, em Manchester. “Por um lado, a negação, a insistência, a compulsão e, por outro, um lado mais passivo, abatido e depressivo.
Vidyamala Burch sofre de dor crónica devido a duas lesões na coluna desde jovem. A primeira aconteceu quando tinha 16 anos, ao tirar uma pessoa da piscina durante um exercício de salvamento; a segunda, cinco anos depois, em resultado de um acidente de carro. Subsequente cirurgia e anos de desgaste seguiram-se. “Tive paralisias do intestino e bexiga e tenho a minha mobilidade reduzida”, disse. Vidyamala admite ter lidado bastante mal com isso nos primeiros tempos, tendo puxado demasiado por si e ignorado as suas necessidades especiais.
Em resultado disso, sofreu um colapso físico quando tinha 25 anos, tendo ficado internada nos cuidados intensivos. Enquanto lá esteve, um padre anglicano guiou-a através da meditação, facto que a fez mudar a sua maneira de pensar. “Tive um ‘click’. Ah! Tenho uma mente que é capaz de me ajudar a lidar com a minha situação.”, disse. Seguiu-se um longo período de reabilitação, durante o qual tentou várias técnicas de relaxamento. Após três anos, Vidyamala encontrou uma, chamada “Meditação Mindful”, que resultava bem com ela.
Mais conhecida atualmente por mindfulness, pode ser descrita como o ato da atenção direcionada ao momento presente, reconhecendo pensamentos, emoções e sensações físicas. Tendo origem no budismo milenar, tem vindo a tornar-se popular no Ocidente enquanto terapia nos anos mais recentes.
Embora mais associado à resolução de situações de saúde mental e fortemente promovido pelo NHS (serviço nacional de saúde britânico) para o efeito, uma das primeiras aplicações nesta parte do mundo foi ajudar nas questões da dor.
Vidyamala Burch explica que quando sentimos um desconforto muito grande, há como “um levantamento” no teu corpo que exclama “isto dói e eu não gosto”. “A resposta intuitiva é desviar a atenção e tentar continuar a levar a vida apesar da dor”, explica. ” O que fazemos com o mindfulness é voltar a nossa atenção para a dor, para investigar o que está a acontecer a cada momento.”
Em 2000, agora ordenada budista, Vidyamala batalhava para encontrar um trabalho remunerado que pudesse fisicamente suportar. Ocorreu-lhe então a ideia de que talvez fosse capaz de ajudar pessoas com dor, isto numa base profissional. Fundou uma empresa social chamada Breathworksonde pessoas com dor crónica fazem um curso de oito semanas para aprender como o mindfulness pode ajudar a lidar melhor com os seus sintomas físicos.
Vidyamala Burch afirma que, após o curso, algumas das suas alunas conseguiram voltar a trabalhar após um longo período de inatividade. Outras dizem que o seu sono sofreu alterações.
Sophie Matthew, que sofre de espondilite anquilosante, um tipo de artrite, disse que o mindfulness transformou a sua vida. “O mindfulness ajudou-me a reduzir para metade a dosagem de analgésicos e sinto muito menos dor do que era habitual”, disse ela. “Como a minha doença é crónica e incurável, costumava entrar num estado de grande preocupação e sofria ainda de uma exaustão terrível. Era tão forte que, às vezes, eu simplesmente não conseguia me levantar da cama de manhã.”
Vidyamala Burch é agora líder no seu campo, sendo que a sua empresa também fornece formação a médicos de clínica geral, e tem acento na comissão interparlamentar para incorporar a meditação mindfulness no NHS.
Da redução do stress à gravidez e tratamentos de fertilização, os programas mindfulness podem ser bastante semelhantes. Mas Vidyamala diz que há “subtis, porém importantes” aspectos do seu curso de alívio da dor que os diferenciam.
O centro chama-se Breathworks por causa do foco que é colocado na respiração. Vidyamala ensina os alunos a reconhecer a tensão causadora da dor e a “respirar para dentro dela”, o que, diz, reduz o impacto no corpo.
Embora seja comum encontrar movimento e exercício noutros cursos, Vidyamala Burch diz que isso pode ser “inapropriado” quando se está a trabalhar com pessoas em estado de dor. “Nós adaptámos o ‘mindful em movimento’, colocando a ênfase primeira no estar consciente enquanto se movimenta, em vez de até onde se consegue mover”, disse. “Você anda para abrir uma porta, sente desconforto, fica tensa em relação a esse movimento e a dor piora.” Vidyamala diz ainda que o seu método para a dor também difere de outros por estar mais direcionado para o quotidiano.
Através da sua prática diária de mindfulness, Vidyamala descobriu quanto tempo pode estar sentada ao computador sem ter uma recaída. “Escrevi ambos os meus livros em picos de vinte minutos”, disse.
Pessoas com dor crónica têm tendência para viver num ciclo de altos e baixos: quando estão num dia bom, dão tudo; depois, como consequência, têm uma recaída. Vidyamala Burch chama isto de ciclo “de maior e menor atividade”.
“Conseguimos que as pessoas fizessem um diários de toda a sua atividade durante uma semana, anotando o que causa um acentuar da dor, o que não causa, e que atividades mitigam a dor.”
Compaixão e bondade são uma parte importante do processo e muitas pessoas auto-recriminam-se pelas suas dificuldades. Mas há condições em que é preciso aprender a conviver com elas, porque elas não vão desaparecer, independentemente da determinação da pessoa ou do poder das drogas. “Há algo de muito belo em aprender em seguir em frente, sejam quais forem as dificuldades, com dignidade, aceitação e elegância”, diz Vidyamala Burch.
“A linguagem guerreira na nossa cultura sobre derrotar o cancro ou fazer determinada coisa apesar duma dada incapacidade diz que devemos ser capazes de ultrapassar tudo”, diz. “A cultura consumista diz que deve haver alguma coisa por aí que me vai deixar melhor. Mas se você vive com uma doença crónica, poderá não melhorar.”