Não fique à espera que sejam os astronautas a mostrar-lhe como transformar os seus dejectos em bens consumíveis. Veja como obter valor a partir dos seus activos líquidos.
Por Zoe Cormier | Gerald Emming (foto)
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Cientistas da Carolina do Sul descreveram recentemente de que forma os astronautas do futuro poderão reutilizar o ar e reciclar a própria urina e outras formas de desperdício em bens necessários, como combustível, nutrientes, água potável e até polímeros e plástico.
No espaço, tudo isto faz sentido. Devido ao pouco espaço disponível numa nave espacial para armazenar tudo aquilo que é necessário, porque não usar levedura geneticamente modificada para produzir bens durante o voo? A urina contém precioso nitrogénio e as fezes estão cheias de matérias de grande utilidade.
Então, porque deixar todo este “divertimento” para os homens das estrelas? Se quiser seguir o exemplo da Nasa e transformar as suas “descargas”, eis alguns dos tesouros que podem ser revelados a partir do lixo corporal:
Drogas legais e ilegais. Há anos que a biologia sintética tem vindo a usar fermento e outros micróbios na produção de vacinas e medicamentos, como a insulina e a penicilina. Isto significa que é possível produzir novas drogas pela nutrição de fermento com nutrientes a partir da urina. Mas porquê ficar pelas drogas utilitárias? Em 2015, cientistas canadianos revelaram estirpes de levedura geneticamente modificadas capazes de converter açúcar em opiáceos. Anfetaminas e alucinogénios podem estar aí ao virar da esquina. E, porque não? Se a vida deve ser tremendamente monótona numa base em Marte, ela já é frequentemente “um saco” aqui na Terra.
Ouro e outros metais preciosos. Acredite-se ou não, os esgotos estão repletos de ouro, prata, platina, titânio e cobre. É difícil dizer de onde vêm exactamente todos estes metais preciosos, frequentemente presentes não só em cosméticos e noutros produtos de higiene pessoal, mas também na nossa comida. O dióxido de titânio é frequentemente acrescentado a vários tipos de “comida de plástico”, como os donuts.
Cientistas da Universidade do Arizona estimam que o valor anual de resíduos por cada milhão de norte-americanos contenha 13 milhões de dólares em metais. E, tendo em consideração que o nosso voraz apetite por metais é causador de múltiplos desastres de âmbito social e ambiental, o mínimo que podemos fazer é reduzir o impacto da nossa adição ao smartphone pela transformação da nossa própria merda em metais que usamos na sua produção.
Tijolos neutros em carbono. Em 2011, investigadores da Yorkshire Water e da Universidade de Leeds revelaram um método que combina a incineração de resíduos com cinzas para produzir tijolo neutro em carbono. Em resposta às necessidades “verdes” da construção civil, lance fogo às suas fezes.
Há anos que os cientistas propõem o uso de digestores anaeróbios nas naves espaciais ou em bases lunares para a produção de metano – um poderoso combustível – a partir das fezes e urina dos astronautas. O futuro chegou finalmente, com o GENeco Bio-Bus em Bristol a assegurar que o “waste isn’t wasted” (o desperdício não é desperdiçado, em tradução livre) pelo uso de biogás produzido a partir de resíduos domésticos. Mas porque não alargar a experiência a todo o Reino Unido? Sejamos francos, ao ponto a que chegámos, nem um rio de esgoto conseguiria piorar os transportes ferroviários de Southern.
Ração animal. Investigadores do grupo Sanitation Ventures da London School of Hygiene & Tropical Medicine têm vindo a desenvolver formas para que 2,5 mil milhões de pessoas mundialmente carentes de latrinas devidamente preparadas possam fazer recolhas, de forma apropriada, tendo em vista um bom (e seguro) uso dos seus resíduos orgânicos. Uma das melhores ideias: alimentar de fezes larvas de moscas soldado-negro, moídas posteriormente para alimentar frangos e peixes. Se o facto de comer frango alimentado a partir dos seus próprios excrementos lhe pode parecer repugnante, pense nos astronautas americanos que beberam água a partir de urina purificada.
Electricidade. Já existem células combustíveis microbianas facilmente capazes de gerar electricidade pelo uso da ureia como combustível. O maior urinol (“central de chichi”) jamais construído foi colocado junto de Pyramid Stage, em Glastonbury, como modelo de uma tecnologia criada a pensar em áreas de sinistro e campos de refugiados. Não existe, no entanto, qualquer razão para que ele não pudesse fazer parte da grande infra-estrutura urbana (investigadores na Caltech já estão a criar urinóis a energia solar para gerar hidrogénio).
Seja qual for a forma que escolhamos para transformar os nossos resíduos, uma coisa é certa: não há nada mais estúpido do que usar água pura para mandar os nossos excrementos cano abaixo, para depois gastarmos uma fortuna para voltar a tratá-los.