Gostar de estudar e fazê-lo com o mesmo sentido de prazer e descoberta com que se desfruta de outras atividades é algo que se aprende desde cedo, com amor e disciplina – ingredientes que os adultos só conseguem dar se estiverem presentes e atentos.
Por Clara Soares
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Isto de ser “bom aluno” tem que se lhe diga. É ser bem-comportado, aprender a fazer e ter sucesso académico? E se for um “bom rebelde”, como no filme que juntou os atores Robin Williams e Matt Damon? Também pode ser um “bom aluno”? A resposta é sim. Basta ter condições para experimentar sem medo de falhar ou de ser deixado para trás.
Aprender a aprender, que resulta em boas notas, implica motivação, método e diversão, as bases para as crianças crescerem felizes. Por isso importa que, desde cedo, os adultos lhes passem a mensagem de que confiam nelas, de que estão lá para as ouvir, compreender e orientar. Isto aplica-se a pais e professores e é particularmente decisivo quando a “retaguarda familiar é menos favorecida, caso em que não podemos deixar os miúdos pelo caminho”.
Luísa Moreira, mentora do projeto Fénix, concebido para combater o insucesso escolar no ensino público, explica como se estimula o valor próprio, ingrediente que os bons alunos partilham, desde o primeiro ciclo: “Aos primeiros sinais de dificuldades na sala de aula, o professor, apoiado por outros docentes, dedica uma disponibilidade acrescida à criança impedindo que ela se agarre à ideia do ‘não vou conseguir’”. A professora, ex-diretora de uma escola do ensino básico, lembra que o projeto, de âmbito nacional, permite aos alunos “sentirem-se apoiados e capazes de acompanhar os colegas”. Sem esta alavancagem, o cenário pode ser outro, como atestam as conclusões do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA), divulgadas este ano no relatório da OCDE: ser adolescente e viver em famílias economicamente desfavorecidas é um fator que pode conduzir a maus resultados escolares. Conclusão: as bases para se ser “bom aluno” cultivam-se cedo e são a missão de todos: comunidade, escola e família.
O ano letivo começa melhor se o cérebro estiver em forma. O que a ciência diz: só aos 25 anos é que o seu desenvolvimento fica concluído. O que fazer até lá: definir horários para as refeições, beber água fora delas e reduzir a comida “de plástico” ao mínimo e criar rotinas. O tempo de descanso e a hora de ir para a cama são as mais difíceis de cumprir, e os efeitos secundários não ajudam.
MÉTODO E CONSCIÊNCIA EMOCIONAL
Estar nas aulas como um zombie, depois de estudar horas a fio. Decorar matéria sem perceber como se aplica à vida prática. Faltar a aulas e trabalhos de grupo por causa das noitadas. Organizar-se só na véspera dos testes. Fórmulas que não funcionam por razões óbvias. Menos óbvio é o papel das competências emocionais e sociais. Mas, quanto mais conscientes delas, maior a garantia de sucesso escolar. Mostram-no os resultados do estudo financiado pela FCT sobre os efeitos das práticas de atenção plena (programa americano MindUp) numa amostra de 454 alunos e 20 professores do 3º ano do ensino básico. Joana Carvalho, psicóloga e responsável pela área da educação no Instituto Mindfulness, confirmou que “a maioria dos professores se sentiram mais realizados e atentos ao que se passava na sala de aula, e essas melhorias também se registaram nos alunos do grupo experimental.” Fernando Emídio, coordenador do 1º ciclo do agrupamento de escolas da Marinha Grande Poente, que entraram na investigação, sustenta que a gestão das emoções compensa: “As melhorias no rendimento deveram-se à maior disponibilidade para aprender, à redução dos conflitos entre pares e ao bem estar na sala de aula.”
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MÉTODOS PARA CADA IDADE
0 – 3 anos Constroem-se os grandes pilares da aprendizagem. Treino das capacidades psicomotoras, sociais e afetivas. Os neurónios mais usados mantêm-se, os outros desaparecem. Recomenda-se brincadeiras que permitam interagir, explorar os cinco sentidos e proporcionar prazer. As birras não devem ser levadas a peito pelos pais e o tempo de sono deve durar entre 11 e 14 horas.
3 – 7 anos Aprendem através do exemplo, por imitação e repetição, que fortalecem redes neuronais e o treino da linguagem e dos hábitos de estudo. Precisam de dormir entre 7 e 12 horas e de ter brincadeiras não estruturadas. A linguagem e a memória consolidam-se com hábitos de estudo e planificação: ambiente tranquilo, sala própria e material arrumado, tempo para os TPC. A personalidade começa a ganhar forma e a aposta recai nas tarefas e jogos que exijam paciência, controlo dos impulsos e capacidade de lidar com emoções básicas (medo, raiva, tristeza, surpresa, nojo, felicidade).
7 – 12 anos Aprendizagem das operações complexas (lógicas) e controlo de sentimentos. Investimento na organização do tempo e método; tirar notas nas aulas, 10 minutos de pausa por cada hora de trabalho em casa, mapas conceptuais, ler em voz alta, usar exemplos práticos, intercalados com tempos livres e atividades em grupo. Tempo de sono recomendado deve durar 9 a 11 horas. Mudanças hormonais da puberdade e treino das emoções secundárias (empatia, desgosto, frustração). Testam-se limites e consequências (responsabilidade) e dá-se início à gestão do dinheiro de bolso, saídas fora da escola e outras tarefas (TPC, arrumar o quarto, passear o cão). Erros de comportamento devem ser corrigidos à medida que surgem, sem excesso de autoridade – nem de permissividade.
12 – 15 anos Pensamento abstrato permite construir hipóteses e fazer planos a longo prazo. O despertar da sexualidade e das emoções complexas surge a par da experimentação e do aumento das distrações. Vale a pena apostar em atividades que promovam a resistência à frustração. O cérebro precisa de 10 horas diárias de sono e pausas frequentes dos estímulos luminosos (gadgets e afins). A influência dos pais é essencial, sobretudo na aceitação de pontos de vista discordantes e na atribuição de autonomia ao adolescente.
16 – 25 anos Cérebro mais apto a identificar erros e consolidar matérias, na interação com colegas. Recomenda-se 7 a 9 horas de sono. Pressão para o sucesso gera ansiedade, que pode reduzir-se se existir um plano de vida e exposição a experiências de contacto com diferentes caminhos possíveis.
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Texto editado por Mindmatters
nota: A autora é jornalista e psicóloga